.1 onde Vinicius mora

HELOISA MENDES
3 min readAug 21, 2023

Hoje minhas palavras dançam nesse quadro branco como folhas tri-dimensionais que só eu consigo em plena sobriedade, enxergar. Buscando de alguma forma, te alcançar e compartilhar contigo os ventos que sopraram por aqui. Nesta segunda onde o trabalho convencional não consegue me manter focada nas tarefas, sentei aqui ansiosa para te contar os eventos que varreram minha existência como um furacão daqueles que sempre falamos, capaz de deixar nossa cidade em pó e, ainda assim, acabar com a guerra da Síria.

Desde criança eu brincava de decifrar padrões e fui amaldiçoada por esse dom que trazia tudo à luz cedo demais, mesmo que eu preferisse muitas vezes, sequer saber. Mas indiferente às minhas artimanhas para evitar ou afastar o tão eminente futuro, a verdade emergia diante de mim firme e inabalável.

Quando os ponteiros do relógio abraçaram a meia-noite no último dia de 2022, eu fechei os olhos com o coração na minha mão e roguei ao universo que me permitisse finalmente renascer no que meu destino traçou. Nesse meu anseio profundo de abandonar essa metamorfose entre ser eternamente a quase-borboleta que me assombrava a cada 365 dias e me doía profundamente, machucando aqueles que caminhavam comigo.

Assim que as vozes entoaram num coro o Feliz Ano Novo na Praia do Canto do Forte, em São Paulo, fixei meu olhar no mar e no céu estrelado, já enevoado pela fumaça dos fogos e confessei: “Este ano, farei tudo o que nunca fiz: experimentarei tudo como se fosse a primeira vez”.

Senti a força inconsciente que despertava em mim, um dos mais dolorosos desvendamentos karmáticos que, na iminência dos meus 24 anos, eu poderia experimentar. A jornada que começa com o desafio de dizer adeus a partes de mim que, ao longo de múltiplas dimensões, estiveram entrelaçadas — uma despedida que ecoou não apenas em uma vida, mas em muitas.

E tudo culminou no dia 3 de Fevereiro. O meu quente e festivo fevereiro.

Me dói muito lembrar aqueles dias em que a incerteza teimava em ocultar o sol de mim. Os passos dessa jornada de autoconhecimento é como pisar nas pedras afiadas de cambury, mas cada dor, cada partezinha de mim que ia se desintegrando, foi me fortalecendo. Eu me sentia intensa, me auto impulsionando a saltar em queda livre, onde não existia sequer o eco de alguém que antes passara por ali. Era somente eu e uma versão de mim que quase se tornara invisível. Eu teimava a manter nossas mãos entrelaças, por saudade. Eu não queria solta-la.
Cada dia foi uma batalha, um choro pesado, arrancando o meu peito fora, uma despedida do que sabia que não voltaria e que de fato, não desejava que voltasse.
Havia apenas um caminho a seguir.
E eu fui, sangrando intensamente o luto e me costurando sem anestesia.
Teci meu casulo pouco a pouco e com muito medo mergulhei em silêncio. Silencio mesmo, absoluto.

Engraçado, não? Tudo que faço é observar, presenciar e abstrair, coisas minhas e somente minhas.
É tendencioso sentir toda essa casa se transformando ao mesmo tempo que os dias correm, o trabalho acontece e tantas outras ataduras são constantemente soltadas de mim. Me sinto leve, tonta e muito solitária, mas não me sinto perdida. Me curando.

Com muito amor, que sempre irá existir aqui

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